Ontem nasceram os cinco filhotes da Violeta e do Alemão Malelus.
Fazia mais de oito anos que não tínhamos filhotes em casa, pois por questão de responsabilidade com o número excessivo de bichanos sem lar, vinha castrando todos os gatos. Mas esses dois, desde o início, tiveram uma relação tão intensa de cumplicidade, irmandade e amor, que resolvi deixar que realizassem o programa biológico mais profundo de um animal: procriar.
A Violeta teve dois cios antes que o Alemão Malelus estivesse “maduro” para ser pai, mas quando aconteceu não foi com aquela violência selvagem que o “macho alfa” faz a fêmea passar. Pode ter sido fantasia minha, mas quando ela reclamava durante o intercurso ou o “namoro”, ele parava e lambia a cabecinha dela até ela se acalmar. Ele esperava. E então, finalmente no terceiro cio, a semente de uma próspera ninhada foi plantada no útero da jovem Violeta. Ela teve uma gravidez tranquila, com o Alemão Malelus sempre por perto, eles dormiam abraçados assim: ele por trás dela na posição “de colher” e com os rabos entrelaçados. Mas não pense que depois da irmandade ter virado “amor adulto” a relação deles mudou. Continuaram brincando loucamente, naquela camaradagem própria dos gatos – calma às vezes e agitada em outras. Diferente de nós humanos, a amizade não se alterou após terem tido um relacionamento sexual – isso simplesmente passou, sem alterar minimamente o que era um equilíbrio perfeito. Que bom se nós humanos fôssemos assim, não é?
Participar do parto foi emocionante. Primeiro ela ficou atrapalhada, já com a primeira bolsa de água arrebentando e ela andando pela casa sem saber o que fazer. E o Alemão miando louco atrás dela, preocupado. Então a colocamos num quarto onde haviam três possibilidades de “maternidade” – ela escolheu a caixinha menor e mais funda e lá se colocou, respirando cachorrinho e tendo contrações. Eu estava fora e, logo que cheguei ela me deu um olhar profundo e um tanto assustado. Eu lhe disse:
– Fique tranquila, eu estou aqui e se você precisar pode contar comigo.
Ela pareceu entender e deixou que eu colocasse a mão e passasse energia no ventre onde eu sentia, regularmente, a onda das contrações. Logo o primeiro gatinho começou a apontar e mais algumas contrações de expulsão e ele estava fora. Daí começa o trabalho perfeito da gata, que sabe parir como ninguém: limpar o bebezinho, cortar o cordão umbilical e assim que desce a placenta, comê-la (o que vai fornecer os hormônios que vão prevenir o sangramento após o parto, facilitar a amamentação e dar proteína para as primeiras 24h, quando ela não deixa o ninho sob nenhuma condição). E depois de tudo limpo e arrumado, com o ninho novamente pronto, já começam as contrações novamente e lá estava mais um gatinho – os primeiros dois rajados de cinza e preto. Eu já começava a pensar que a semente de nosso Alemão não tinha frutificado aquele ventre quando começa a nascer um terceiro gatinho, todo amarelo/laranja, igualzinho a ele. Mas este, complicou. Ela ficou atrapalhada, talvez porque logo já começaram as contrações para o próximo e não deu tempo de “organizar” o ninho. Ela me olhava desesperada, peguei com uma toalha (pois é importante não tocar filhotes recém nascidos, porque depois a mãe pode recusá-los por não reconhecer o cheiro) os dois filhotinhos nascidos primeiro e comecei a passar energia para eles com as mãos. Ela miou, eu abri a toalha e mostrei, dizendo:
– Cuida destes que estão vindo, eu cuido desses aqui.
Ela pareceu entender e se concentrou naquele parto triplo que estava deixando-a exausta.
Antes que ela pudesse comer a placenta do terceiro, o quarto já estava vindo – outro da raça “Malelus”, igual ao Alemão. E logo em seguida, veio o quinto. Ela me olhava exausta e ensanuentada, eu sentia uma vontade imensa de ajudar, mas me mantive presente, tocando-a carinhosamente e energizando-a, deixando que ela fizesse o que sabe fazer instintivamente – cuidar de sua ninhada. Assim que ela conseguiu finalizar o processo de nascimento destes últimos três, troquei delicadamente a toalha molhada embaixo dela e lhe devolvi os dois filhotes que ronronavam deliciosamente em minhas mãos – um ronronar de bebês, algo como um bater baixinho numa latinha. Ela os recebeu e me deu um olhar profundo e agradecido. Deixei-a sozinha, pois me parecia que era adequado e fui atender minha cliente das 14:30h.
Quando voltei três horas depois, o ninho estava seco, limpo e arrumado, cinco gatinhos impecáveis mamavam em fila. Ela ronronava e dava-lhes um abraço que continha a todos.
Estava exausta, mas de uma plenitude… que não sei como expressar em palavras.
E eu, que tenho as mais deliciosas memórias das ninhadas de sete gatinhos que minha gata Mimi me dava duas vezes por ano, fiquei horas olhando aquele milagre. E fiquei pensando que nós, mulheres, também temos esta programação biológica de liderarmos e sermos as “agentes” dos partos de nossos filhos. E, no entanto, o Brasil lidera o ranking mundial de cesarianas. Onde perdemos nossa capacidade de “parir como gatas”? Enfim, este é outro post e em outra categoria!
E agora deixa eu lhe contar sobre o pai, o Alemão Malelus. Durante o parto ele ficou tão agitado e preocupado. Miava alto, arranhava a porta do quarto, corria do outro lado na janela e miava, miava desesperado. Tivemos que colocá-lo em outro cômodo trancado, pois ela precisava de concentração. Ao apresentá-lo aos filhotes fiquei muito cuidadosa, pois é comum os gatos matarem as crias para que a gata entre no cio, o que acontece imediatamente se ela perde os filhotes. Ele olhou aquilo, deu uns “ráss e fusss” e saiu. Mais à noite, ele ficou curioso novamente e o deixei entrar. Desta vez, ele chegou até ela, deu um beijinho de focinho como fazem os gatos, olhou os gatinhos enfileirados mamando e lambeu a cabeça da Violeta, longamente. Depois deitou em sua posição “enfinge” entre a caixinha e a porta e ficou de guarda. Ele havia aceitado os filhotes.
De vez em quando ele cheira a caixinha toda, olha intrigado a cena dela no ninho e parece confuso. Depois de um tempo vem até ela e o ritual do beijinho e das lambidas na cabeça acontece de novo. Depois ele vai para sua posição de guarda.
Pode ser fantasia minha, porque bichos não tem um neocórtex em seu cérebro que permita a eles “pensar”, mas é assim que eu vejo acontecer.
Hoje pela manhã, menos de 24 horas depois do parto, Violeta segue em sua caixinha, no cuidado minucioso de manter os filhotes limpos, aquecidos e alimentados. E segue ronronando, ronronando, com um tal olhar de completude e felicidade que meu coração fica exultante só de olhá-la. Gratidão, querida Violeta. Que bom que, ao contrário de muitas gatinhas que tem seus filhotes sem a proteção de uma família humana que os ame, a Violeta pode agora cuidar amorosamente e tranquilamente de seus filhotes, até que chegue a hora de seguirem para seus “Humanos”.
Que emocionante! Ai, ai, acho que vou mesmo me candidatar a receber um gatinho amarelo aqui em casa, filho desse amor!
Bjo gata-mor, grata pela compartilha.